Era uma vez um burrinho. Burrinho como os demais burrinhos
que viviam no pasto e que prestavam serviços, quando necessitavam deles.
Um dia, houve grande festa naquela terra. Era feriado.
Feriado nacional. Comércio fechado. Escolas sem aula. Tudo parado.
Nas avenidas principais daquela cidade, devidamente
ornamentadas, aconteceria propagado desfile militar e escolar. É que as joias,
insígnias, bandeiras, medalhas, coroas que pertenceram ao rei daquele país
seriam apresentadas ao povo, esparramado pelas calçadas.
Aí, precisaram de um burrinho que transportasse,
processionalmente, aqueles tesouros, que representavam a história gloriosa
daquela nação.
E o burrinho, de que lhes falo, foi apanhado, lá no pasto.
Colocaram régios arreios sobre seus lombos, ornamentos dourados que brilhavam
ao sol daquela manhã engalanada e festiva. Encimando aqueles arreios, dispostas
com muita arte e gosto, as preciosas joias reais. No desfile militar, o pacato
quadrúpede ocupava lugar de destaque, comandando a parada.
Rojões espocavam, a multidão aplaudia, a tropa se perfilava,
numa alegria contagiante, que deslumbrava e emocionava.
Acabado o desfile, retiraram as joias que o burrinho
carregava, os arreios dourados, os adereços todos e ele foi levado de volta ao
pasto, sem maiores formalidades.
Lá chegando, o burrinho começou a conversar com os outros
burricos, seus companheiros. Disse ele, vaidoso:
- Vocês viram o que me aconteceu? Andei pelas avenidas da
cidade, nesta manhã. E quando eu passava, soltaram fogos e foguetes, houve
aplausos de todos os lados, uma beleza! Até os soldados perfilaram-se, em
continência, enquanto bandas de música celebravam a festança.
Vejam como eu sou importante! Vejam!
Aí, um outro burrico, que ouvia aquela bazófia do
companheiro gabola, desafiou-o:
- Se você é tudo isso que está dizendo, tenha a coragem de
retornar às avenidas por onde passou. Vá. Eu quero ver o que acontecerá...
O burrinho vaidoso aceitou o desafio. Foi. Mas quando ele
passava, apesar da cadência de seu passo garboso, moleques atiravam-lhe pedras,
populares enxotaram-no aos gritos, brandindo relhos e chicotes, numa correria
bárbara.
Cansado, resfolegando, envergonhado, assustadíssimo, o
burrico retornou ao pasto, onde encontrou seus amigos, que o receberam com
desprezo e desdém.
- E agora, o que dizes? – perguntaram-lhe, com zombaria.
Então o burrinho vaidoso, cabisbaixo, filosofou:
É. É verdade. Eu não tinha importância alguma. Eu sou
igualzinho aos outros burrinhos. Só fui aplaudido porque e enquanto carreguei
as jóias do rei...
Linda lição para nós! Para cada um de nós, hoje. Nela
reflitamos, com humildade, na presença santíssima do Rei, de quem somos apenas
servos, tantas vezes inúteis...
Rev. Ivan Espíndola de Ávila (Escritor e poeta, autor de
vários livros, é presidente da Academia Paulista Evangélica de Letras).
Fonte: http://www.ipicarrao.org/reflexoes/a_gloria_do_burrinho.htm